José do Nascimento | Entre Sintra e Lisboa

Entre Sintra e Lisboa existem duas vias principais, uma rodoviária e outra ferroviária, só que a determinadas horas, venha o diabo e escolha…

O IC-19, já teve o estatuto de via rodoviária mais movimentada da Europa, não sei se ainda ostenta o troféu, mas sei que de manhã, às primeiras horas do dia, continua a ser uma via nada recomendável.

O comboio, para quem parte de Sintra ou dos dois ou três apeadeiros seguintes, e caso o utente tenha uma estação terminal como destino, Rossio ou Oriente, não oferece problemas, mas se o destino fica em ponto intermédio, o calvário é conseguir sair do combóio, furar entre as pessoas já esmagadas, umas contra as outras, até se conseguir encontrar a saída.

A melhor opção parece ser a de não se procurar lugar sentado e tentar decorar de que lado está a plataforma do destino e ficar-se junto à porta respectiva. Esta opção tem alguns riscos que um dia ironizei numa história rimada vinda do início dos amos 80 do passado século e que dizia a determinado passo:

“… E vem-nos à memória
A velha máxima da História:
‘Dois corpos não podem ocupar
Simultaneamente o mesmo lugar’.
Que cessem todas as heresias,
Calem os Newton e Galileu
E quejandos de velhas teorias
Que sabem menos do que eu!
Ouçam os que ainda podem escutar:
No comboio das sete e meia
Vão mais de dezena e meia
Num só lugar…”

Um pouco mais frente, não só na história rimada como no percurso do comboio que tinha saído de Sintra às sete e meia, acrescentei:

“… Uma senhora ao pé da porta
Menos viva que morta
Forçadamente apeada
Na estação da Damaia,
Quase tão amarrotada
Quanto a sua saia
Grita a um senhor bem posto
De ar mal disposto
Que passava por ali:
Eu nem queria sair aqui!’”

A história acaba no Rossio com preces aos deuses por se ter conseguido chegar ao destino, mas a última estrofe que acabo de recordar, relata o perigo de ficarmos junto à porta para ser fácil sair na estação ou apeadeiro que escolhemos, mas com o risco de acabarmos despejados antes do destino desejado.

O que acontecia nos anos 80 do século XX, continua a acontecer no final da segunda década do século XXI.

Esta é uma história rimada, há quem lhe chame poema, mas eu não lhe dou esse estatuto.

A verdade é que contra minha vontade, mas a lei da vida assim o obriga, recentemente tenho sido obrigado a frequentes deslocações à capital e, numa dessas viagens lembrei-me do velho escrito que tentou retratar a CP e o serviço que prestava à cerca de 30 anos… Em 2018 não encontrei grandes diferenças ao serviço que hoje vai oferecendo, mas o IC-19, não é alternativa de melhor qualidade.

É bom ser sintrense, desde que não haja necessidade de deslocações a Lisboa e que se venha a conseguir controlar a desenfreada pressão turística que está a retirar qualidade de vida a quem por aqui vive.

Não me apetece nada fugir daqui!

José do Nascimento