Cristina Chagas, Coordenadora de Gastrenterologia do Hospital CUF Sintra

Em cada 100 mil portugueses, 150 sofrem de doenças inflamatórias intestinais, e a tendência é para que o número aumente, nos próximos anos. Estas doenças, quando não diagnosticadas atempadamente, podem  causar danos graves à saúde. Para perceber quais os sinais de alerta e como é feito o diagnóstico estivemos à conversa com a Coordenadora de Gastrenterologia do Hospital CUF Sintra, Cristina Chagas.

As doenças inflamatórias intestinais (DII) são provocadas por um distúrbio imunológico, que origina uma intolerância aos antigénios da flora intestinal, levando à inflamação crónica. A doença de Crohn e a colite ulcerosa são as principais. A doença de Crohn pode afetar todo o tubo digestivo, da boca até ao ânus, provocando inflamação, erosões, úlceras e, até mesmo, estenoses (estreitamentos) intestinais, fístulas ou abscessos. Já a colite ulcerosa afeta o intestino grosso, havendo doentes em que apenas o reto ou parte do cólon são atingidos e outros, com formas mais graves, em que todo o intestino grosso fica inflamado.

Normalmente, as DII provocam crises que alternam com períodos de relativa melhoria e, nalguns casos, pode haver associação com outras doenças autoimunes. Estas doenças são progressivas e a sua evolução natural vai conduzir, em muitos casos, a danos graves e irreversíveis do tubo digestivo, daí a importância de um diagnóstico precoce: permite-nos iniciar atempadamente o tratamento adequado, evitar a progressão da doença e restituir a qualidade de vida dos doentes.

Sim, os sintomas não são exclusivos destas doenças e, além disso, não existe um exame específico para as diagnosticar. Portanto, o diagnóstico pode ser difícil, porque requer um elevado grau de suspeição por parte do médico, com base num conjunto de sintomas, análises clínicas, exames endoscópicos, histológicos (biópsias) e imagiológicos.

No Hospital CUF Sintra temos a capacidade e a segurança necessárias para fazer um diagnóstico preciso e completo das DII, através de exames como a endoscopia alta, a colonoscopia, a videocápsula endoscópica (que permite, de uma forma não invasiva, observar todo o intestino delgado, para verificar a existência de lesões) e a ressonância magnética do intestino delgado. Além do diagnóstico, estes exames também nos permitem avaliar a extensão da doença e acompanhar a resposta ao tratamento.

Cristina Chagas destaca que trabalha com “uma equipa de gastrenterologistas dedicados e com muita experiência no diagnóstico e seguimento destas patologias, apoiada por duas salas de exames de Gastrenterologia, com equipamentos de última geração”.

Mais de um terço dos doentes apresentam manifestações das doenças inflamatórias intestinais noutros órgãos. Por isso, é fundamental uma abordagem diagnóstica e terapêutica multidisciplinar, com articulação entre o gastrenterologista e outras especialidades médicas. Por exemplo, nos casos em que a doença afeta as articulações dos membros ou da coluna vertebral, provocando um tipo de reumatismo inflamatório, nomeadamente espondilartrites e sacroileítes, é fundamental que os doentes sejam acompanhados por especialistas em Reumatologia. Nos casos em que apresentam queixas oculares, na sequência de doenças dos olhos como uveítes ou iridociclites, necessitam de orientação da Oftalmologia.

A Dermatologia também pode ser envolvida, para tratamento de manifestações na pele, e a Proctologia pode ajudar no tratamento de fístulas ou abscessos perianais. É por isso mesmo, no Hospital CUF Sintra, temos médicos experientes nestas múltiplas áreas que, de forma articulada, podem dar resposta às necessidades de cada doente.

Estas doenças crónicas, que afetam mais as mulheres, costumam surgir entre os 20 e os 40 anos – precisamente quando a vida familiar, social e laboral é mais ativa – e obrigam a mudanças drásticas no estilo de vida. Além dos sintomas físicos, também têm impacto na saúde mental, afetando os relacionamentos, atividades sociais e profissionais. Há, no entanto, cuidados e hábitos que as pessoas com DII devem procurar discutir com a  equipa médica e que, sem dúvida, contribuem para a qualidade de vida, nomeadamente: a adesão ao tratamento e a dieta alimentar.

Embora as suas causas não sejam bem conhecidas, existem fatores de risco de ordem genética, que fazem com que os filhos ou irmãos de doentes com DII tenham maior probabilidade de desenvolver a doença. No caso da doença de Crohn, são também fatores de risco o tabagismo, o uso de antibióticos nos primeiros anos de vida e o uso de anti-inflamatórios não esteróides.

A nossa alimentação tem um papel fundamental no desenvolvimento e na diversidade da microbiota intestinal, que, por sua vez, desempenha um importante papel na prevenção ou no favorecimento destas doenças. A ingestão de alimentos ultraprocessados, com aditivos ou de gordura animal tem sido associada a maior risco de DII. Por outro lado, a amamentação, o consumo de fibras e frutas frescas e o exercício físico são fatores reconhecidamente eficazes na proteção contra estas doenças.

TESTEMUNHO: Bruno Silva

Bruno Silva tem 42 anos e vive em Barcarena. Recebeu o diagnóstico de colite ulcerosa em 2005, quando tinha apenas 23 anos. “Na altura, foi um choque muito grande”, recorda. “Era muito jovem e fui diagnosticado com uma doença crónica, sem cura e com a qual terei de lidar para o resto da vida”. A partir desse momento, sentiu que a sua vida se alterou. “Tive de mudar a minha alimentação, a forma como faço desporto e, até, a socialização com os outros. Quando saía de casa, procurava estar sempre num sítio confortável, com casa de banho por perto, e cada ida à rua era calculada praticamente ao minuto”.

Em retrospetiva, Bruno confessa que já encara a doença de uma forma diferente: “já me acostumei aos novos hábitos. De vez em quando, há dias menos bons, mas o impacto inicial já passou. O acompanhamento da Dr.ª Cristina Chagas, nas consultas de rotina e nos tratamentos, a sua constante disponibilidade para esclarecer as minhas dúvidas e o seu apoio, tanto nos momentos bons, como nos maus, fizeram muita diferença na minha vida”.

Para todos aqueles que estão a passar pelo mesmo, deixa uma mensagem de esperança: “no início, sentimo-nos sozinhos e incompreendidos, mas, com o passar do tempo, as coisas tomam o seu rumo. Não se deixem controlar pela doença – não é o fim do mundo”.