António Luís Lopes |”Ética Republicana – Precisa-se!”

Opinião

“Uma das questões que, na atualidade, deve merecer a máxima atenção de todas as forças democráticas, diz respeito ao crescimento a que temos vindo a assistir, no nosso País, do populismo de extrema-Direita.

Um populismo que utiliza o descontentamento como arma de arremesso. Que cultiva a xenofobia e a violência. Que vive da encenação e da mentira. Que não hesita em confrontar e colocar em causa a Ciência, como se tem visto relativamente ao processo de proteção e vacinação contra a COVID 19, desde que isso seja útil para a sua agenda de conquista do Poder.

Mas nada acontece por acaso.

E o populismo começa por encontrar terreno para crescer no próprio sistema político, por exemplo, sempre que alguém adere a um partido não para defender causas e valores mas para procurar ocupação e fazer “carreira”. Sempre que o mérito é ultrapassado pelo “aparelhismo”. Sempre que os interesses suplantam as convicções. Jorge Coelho, saudoso e aguerrido militante do PS, dizia em tempos, em entrevista ao DN – “Passa-se algo de errado quando o fim das organizações se esgota no vértice da hierarquia ou na nomenclatura dirigente. Torna-as fúteis, passageiras e dependentes” .

Sim – o populismo cresce quando a verdadeira e genuína militância abre lugar ao “carreirismo” e ao “culto do chefe”. À conta da ignorância atrevida de quem nunca concluiu curso algum mas papagueia soundbites. De quem nunca trabalhou numa empresa e desconhece os seus constrangimentos. De quem nunca discorda, mesmo do que está errado, porque teme desagradar a quem manda. De quem faz juras de amor eterno aos cidadãos que o elegeram mas depois rapidamente tudo esquece quando lhe oferecem lugar mais apetecível. De quem ascende a dirigente e passa a viver numa “bolha” afastada das “bases”, fazendo o contrário daquilo que prometeu e alimentando a intriga e a mediocridade.

Este “modelo” reproduz-se nos diversos níveis de detenção do Poder – e o cidadão comum sente-se excluído, enganado, acossado. Há o “Eles” – os “políticos” – e o “Nós” – com um abismo de desconfiança pelo meio. E ainda que, obviamente, existam excepções – dificilmente conseguem remar contra esta maré.

Não há Democracia sem partidos. Mas se alguém deixou que este “veneno” corroesse os partidos e afetasse a sua imagem junto dos eleitores – não tardará que “alastre” sobre a Democracia no seu todo. É nisso que o populista é mestre – no aproveitamento do legítimo descontentamento dos cidadãos.

Vamos ter, brevemente, eleições Autárquicas. O Poder Autárquico constitui uma das mais belas conquistas do 25 de Abril de 1974. A possibilidade dos agentes locais, dos “filhos” de cada terra, poderem ser eleitos e contribuírem para o desenvolvimento das aldeias, vilas e cidades onde vivem. Também neste âmbito é de esperar o ataque da agenda populista – e quem tiver “rabos de palha” ou for incapaz de fazer o combate político devido, será “presa” fácil. Porque é de POLÍTICA que falamos – no seu sentido mais nobre – desde a eleição de um Presidente de Junta até à do mais alto representante da Nação. Política – que é missão e não emprego; é serviço, não é servir-se; é convicção, não é vaidade.

Muito se ouve também falar de Ética Republicana – pior é depois verificá-la no comportamento diário de alguns que tanto a citam. Porque a Ética Republicana representa a integridade, a capacidade de servir os outros, a lisura, a solidariedade, o primado do mérito, a transparência, a Honra – e se esse chão tivesse sido suficientemente “tratado” nos últimos 40 anos, não haveria populismo daninho que crescesse, pelo que é mau sinal vê-lo agora a irromper por todo o lado.

Termino citando Aristóteles:

“A turbulência dos demagogos derruba os governos democráticos.”

Esperemos que ainda haja tempo, num futuro próximo, para mudar grande parte daquilo que já devia ter sido mudado há muito. Esperemos que a genuína participação política volte a ocupar o lugar que merece e que a cidadania volte a ser um Valor exibido com orgulho. Que se encurte o “fosso” de incompreensão entre governantes e governados. Que a Justiça seja célere e não esteja reservada apenas para quem a possa pagar. Que a Educação tenha força para vencer a ignorância e a intolerância. Que o Trabalho volte a ter a dignidade que o lucro a todo o custo lhe retirou. Porque uma coisa é certa – só isso impedirá o populismo de se transformar na opção dos que já nada têm a perder.”

António Luís Lopes