Nuno Azinheira | “Parabéns, Sporting!”

Crónica

Parabéns, Sporting! A primeira frase tem de ser esta. Sim, mais à frente falarei da forma impensável como as autoridades permitiram que acontecesse o óbvio. E de passagem falarei também da falta de civismo de uns quantos e da forma como Lisboa “dormiu” e acordou depois do vendaval. Mas, primeiro, o Esforço. A Dedicação. E a Glória.

Eis o Campeão! Sou do Benfica, como sabem, e adoro futebol. Sei ver futebol. Há muito que não me lembro de uma vitória tão justa, tão clara, tão transparente. Quer pela disparidade na constituição (leia-se valor investido) dos plantéis. Quer pela fanfarronice dos seus treinadores. Quer pela efetiva valia técnica dos seus jogadores. Quer pela qualidade de jogo que o Sporting demonstrou. Caramba, uma equipa que lidera um campeonato como o nosso desde a sexta jornada só poder ser uma justa vencedora. Sem casos, sem triunfalismos.

Ser um benfiquista que ajudou a tornou isto possível é a nossa secreta irónica consolação. Rúben Amorim, de quem gosto desde sempre, é o treinador que eu há muito desejava ver na Luz. É ele o artífice desta vitória leonina, pela forma como treinou, motivou e fez jogar a equipa. Mas Frederico Varandas, um presidente que só o é por oposição ao antecessor, merece uma palavra de reconhecimento. Quando chegou ao clube, o Sporting vivia uma das páginas mais negras da sua história, era motivo de piada entre os rivais.

Nas últimas largas semanas, quando percebi que o meu Benfica, inconstante e incompetente dentro das quatro linhas, não poderia ser campeão, passei a torcer pelo Sporting (não, não é verdade que os benfiquistas não conseguem desejar o sucesso do eterno rival. Pelo menos, este benfiquista). E fui deixando-me conquistar pela alegria crescente dos meus amigos sportinguistas. Nestes últimos dias, comovi-me mesmo com histórias, atitudes e palavras de jovens sportinguistas anónimos, que nunca tinham visto o seu clube campeão.

Ontem, enquanto passeava os cães, às cinco da tarde, cruzei-me no centro de Lisboa com muitos jovens, de camisola verde e branca vestida, a caminho do estádio, numa atitude de fervor clubista que não se explica, até porque estes miúdos nunca tinham conhecido sentimento igual. Não, não há aqui qualquer insuportável paternalismo benfiquista. É mesmo genuíno.

Claro que teria preferido ter sido eu a fazer festa, mas, caramba, se há gente que a merece é esta. Por isso, aquilo que aconteceu no exterior do estádio era tão previsível que até parece chocante a ingenuidade e/ou incompetência de quem, nos gabinetes e nas esquadras, achou que bastava apelar ao civismo para que, por milagre, a distância de segurança se aplicasse.

É fácil responsabilizar os adeptos – e é verdade que a pandemia em que vivemos (não, ainda não acabou!) deveria ter despertado uma réstia de bom-senso nas pessoas. Mas só quem nunca foi a um estádio, só quem não tem a correr nas veias o sangue da tribo de futebol acha que seria possível travar o que aconteceu apenas com palavras de recomendação. Se os adeptos falharam, as autoridades policiais e os responsáveis políticos falharam ainda mais. Antes e depois. O álcool fez o resto. E aí tanto faz ser verde ou tinto. Com os festejos benfiquistas e portistas é a mesma coisa.

O regabofe ao longo da noite de um dia de semana, as buzinadelas, os cânticos às cinco da manhã, os vidros de carros partidos, as papeleiras incendiadas, as garrafas de vidro partidas em cacos pelas ruas, as latas deixadas em todo o lado são o lastro habitual, que deveria ter merecido, por parte dos responsáveis municipais, um cuidado e planeamento, que, também neste caso, manifestamente não houve.

Nuno Azinheira. Consultor de Comunicação.